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O processo eleitoral no Brasil chegou ao fim. Nesta etapa pós-eleições, este blog continuará acompanhando as análises e desdobramentos da participação dos evangélicos (e da dimensão religiosa) no pleito 2010.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Os vencedores das eleições no Brasil: os evangélicos

Candidatos cortejaram o bloco em crescimento por apoio no 2º turno da eleição de Domingo

Por John Lyons, Wall Street Journal

Nota da editora do Blog: Circulam em vários sites brasileiros referências a esta matéria, a partir de uma versão em espanhol, com textos interpretativos. Aqui, a matéria como foi publicada na íntegra, traduzida do original no inglês.

Os brasileiros vão às urnas no domingo (31/10) para determinar seu/sua próximo presidente, mas um grande vencedor nesta temporada eleitoral já emergiu: os cristãos evangélicos.
A ex-Chefe da Casa Civil Dilma Rousseff deve ganhar as eleições, de acordo com a projeção do Instituto Datafolha de 56% contra  44% do ex-governador de São Paulo José Serra. A surpresa é como muito da reta final da campanha neste país predominantemente católico foi moldado por bloco cada vez mais poderoso de protestantes conservadores.
Desde que o Brasil voltou à democracia em 1985, as eleições presidenciais têm sido dominadas por questões econômicas já que o país tropeçava de crise em crise. Temas potencialmente explosivos como a legalização do aborto e o casamento gay eram raros na linha de frente, embora a nação de 190 milhões de habitantes seja frequentemente chamada de “o maior país católico do mundo ”.
Agora, uma campanha de base com sermões, vídeos na internet e DVDs distribuídos principalmente por pastores evangélicos provocaram questões como aborto e casamento gay a entrarem abruptamente na agenda política e forçaram Dilma e Serra a declararem posições. Apoiados por alguns bispos católicos conservadores, os evangélicos mobilizaram pelo menos parcialmente, em resposta à aprovação do governo, no ano passado, de um amplo plano social apoiado pelo partido de Dilma Rousseff que incluía um apelo a maiores direitos aos gays e diretos em relação ao aborto.
A fim de reforçar o apoio entre os conservadores religiosos, tanto Dilma quanto seu rival Serra passaram a se opor ao aborto legal em suas plataformas de campanha. Isto significou para Dilma uma grande guinada para a direita, sendo ela uma ex-guerrilheira marxista que apoiou a legalização do aborto no passado.
“Nós escrevemos um novo capítulo na história da nossa nação”, disse Silas Malafaia, um televangelista brasileiro popular que remeteu mais de 300 mil DVDs em setembro admoestando seguidores a não votarem por candidatos que descriminalizassem o aborto ou estendessem mais proteção legal aos gays.
Na quinta-feira (28/10), o Papa Bento XVI também instruiu um grupo de bispos brasileiros a conclamarem paroquianos a votarem por candidatos que se opusessem à legalização do aborto.
O debate político no Brasil está se ampliando em meio à prosperidade econômica, alguns teóricos dizem. “Questões morais normalmente ficam em segundo plano em relação a questões institucionais e econômicas”, diz Paul Freston, um professor na Universidade Federal de São Carlos que escreveu um livro sobre evangélicos e política no mundo em desenvolvimento. “Isto pode estar mudando, e se está, é ainda mais um sinal de como um processo democrático mais estável, próspero, abre espaço para outras questões”.
O fenômeno ajuda a explicar, em primeiro lugar, porque o Brasil está realizando um segundo turno eleitoral. Dilma tinha se preparado para receber o apoio dos 50% dos eleitores necessários para vencer o primeiro turno das eleições em outubro, fazendo campanha como a sucessora  escolhida pelo  presidente fortemente popular Luiz Inácio Lula da Silva. Mas no dia da votação, Dilma caiu abaixo do limite. Cerca de um milhão de eleitores a abandonaram por razões religiosas, de acordo com a pesquisa do Datafolha. Eles vieram no topo de três milhões de desertores, que citaram como razões de desistência, acusações de corrupção envolvendo uma alta assessora de Dilma.
Muitos eleitores migraram para a candidata de um terceiro partido, temático, Marina Silva, uma evangélica convertida e ex-seringueira da Amazônia, que fez campanha pela proteção do meio-ambiente. Marina ficou em terceiro lugar no primeiro turno, com 19% dos votos. Ela não apoiou nenhum dos dois candidatos que permaneceram na disputa.
Muitos eleitores evangélicos, tipicamente da ampla classe empobrecida, confiam no esquerdista Partido dos Trabalhadores de Dilma, fundado por Lula, no oferecimento de serviços às suas regiões relegadas ao esquecimento. No entanto, com todos os três candidatos expondo prescrições econômicas similares, ficou mais fácil para os eleitores tradicionais do Partido dos Trabalhadores abandonarem o navio.

[Este quadro intitulado “Subindo. O número de protestantes na legislatura está subindo na maior parte do Brasil católico” traz a nota: “A atual legislatura é composta por 513 deputados e 81 senadores. Fontes: Freston, Fonseca; Frente Parlamentar Evangélica]

Douglas Gonçalvez, um funcionário do aeroporto do Rio de Janeiro de 28 anos, que se converteu ao protestantismo evangélico sete anos atrás, diz que ele votou por Lula quatro anos atrás e estava apoiando Dilma. Mas ele mudou depois de um sermão do Pr. Malafaia avisando que Dilma podia legalizar o aborto e expandir os direitos gays. O pregador endossou Serra na televisão.
O conservadorismo religioso pode parecer fora do lugar no Brasil, mais conhecido por dançarinas seminuas girando nos desfiles anuais de Carnaval no Rio. Mas o Rio é também morada de uma ampla comunidade evangélica. E longe do litoral, muito do Brasil são áreas rurais, onde pequenas igrejas estão ao longo de rodovias e caminhões ressoam com imagens reflexivas de Jesus em seus parachoques.
De acordo com muitas estimativas, cerca de 20% dos brasileiros são agora evangélicos – a maioria pertencente a igrejas pentecostais tais como a Assembleia de Deus. Estes estão entre as maiores populações mundiais de evangélicos fora dos EUA.
As igrejas evangélicas estão desempenhando um papel crescente na política brasileira, principalmente apoiando candidatos ao parlamento. Este foi um ano marcante: evangélicos que se autoidentificaram como tal ganharam 50% cadeiras a mais no congresso na eleição de outubro, 71 do total de quase 600 cadeiras. Os membros evangélicos no congresso são frequentemente eleitos por protegerem os interesses de suas igrejas, que controlam grandes redes de televisão e rádio. Eles são politicamente diversificados, apoiando tanto o governo quanto a oposição. Sua influência cresce quando eles se unem para mover todo o debate sobre questões sociais para a direita.
Para Dilma Rousseff, a deserção dos eleitores evangélicos se tornou o primeiro grande teste para a sua habilidade de gerenciar sua coalizão política. Estes apoiadores demandaram clareza nas questões como aborto. Em uma entrevista a um jornal em 2007, ela tinha dito que é um “absurdo” que o aborto seja ilegal, uma afirmação que lhe rendeu muitas apoiadoras feministas. Mas num encontro em 13 de outubro em Brasília com 51 líderes religiosos, ela prometeu que não iria apoiar iniciativas de legalização do aborto. Depois, ela colocou o compromisso no papel.
Numa noite de segunda-feira recente, numa periferia empobrecida do Rio de Janeiro, o Pr. Malafaia disse a 3 mil fiéis que lotavam os espaços de sua congregação da Assembleia de Deus, que Dilma Rousseff tinha mudado sua posição sobre o aborto. A congregação respondeu com gritos de “Aleluia!”.
A mudança de Dilma Rousseff estancou deserções evangélicas. E também desencadeou críticas. Provocou críticas ao fato de que líderes em uma sociedade secular estejam se rendendo a demandas religiosas. “Como nós podemos estar no século XXI, em uma sociedade secular, onde candidatos a presidente devem se submeter a demandas religiosas?” perguntou Lucia Hippólito, uma das comentaristas de rádio com maior público no Brasil.
Para líderes feministas, que esperavam que Dilma Rousseff inaugurasse uma nova era dos direitos das mulheres como a primeira mulher presidente do Brasil, o caso foi um profundo golpe. “Pensei que seria o momento para realmente discutirmos as questões das mulheres, mas não se deu assim”, disse Natalia Mori, codiretora do Cfemea, um dos maiores grupos pelos direitos das mulheres do Brasil.

Escreva para John Lyons: john.lyons@wsj.com

Fonte: Wall Street Journal On Line: http://online.wsj.com/article/SB10001424052702304316404575580052462921346.html?mod=WSJ_latestheadlines(29 de outubro de 2010)

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